S�o Crist�v�o � um bairro com alma imperial. Aqui, pode-se sentir hoje esse esp�rito de ontem, de passado grandioso e aristocr�tico. Em largas avenidas, casar�es parecem abrir-se para que entrem carruagens com damas empoadas que voltam de seu passeio matinal.
O imenso gramado verde que cerca o pal�cio, hoje mal cuidado como um tapete castigado pelo tempo, j� n�o acolhe fam�lias com seus farn�is de piquenique, pr�tica comum h� algumas d�cadas; por�m, as �rvores centen�rias l� est�o, como testemunhas mudas que agitam sua imensa galharia ao vento, o mesmo vento que arrancou perucas de duques e marqueses, quando chegavam para as confabula��es e encontros conspirat�rios da elite imperial, donde emanava o poder de vida e de morte num imenso e belo pa�s dividido em prov�ncias, quase sempre em m�o de �ulicos seguidores do imperador.
Passado, tradi��o, aristocracia, mas nunca o imobilismo retr�grado. Neste bairro de contrastes, � poss�vel ver dali mesmo, da janela do pal�cio, hoje museu, a casa do Bar�o de Mau�, s�mbolo da ousadia empresarial, em que as pr�ticas da burguesia capitalista iam corroendo, com o �cido dos interesses financeiros e comerciais, a estrutura de poder escravagista e assentada nos monop�lios.
Ah, e a paix�o? A Casa da Marquesa de Santos a� est�, evocando o romantismo libertino do Primeiro Pedro, amor proibido afrontando o convencionalismos hip�critas...
Mas, S�o Crist�v�o oferece-nos no presente um impressionante contraste com seu aristocratismo passado. Basta lembrar, do outro lado, a Feira de S�o Crist�v�o. Esse enclave cultural nordestino exibe- nos toda a riqueza multicultural do Brasil.
Feira das del�cias regionais: carne-de-sol, queijo de coalho, boas pingas, rapadura; feira do chamego ritualizado no forr�, que se dan�a agarradinho, no "bate-coxas" mais discreto ou na umbigada mais chegada ao despudor; feira da saudade da terra t�o �rida, in�spita mas presente cotidianamente, e relembrada, depois de uma semana de �rdua labuta, neste improvisado peda�o simbolizado da terra natal. Nada menos aristocr�tico e mais plebeu; nada mais povo, mais gostoso.
S�o Crist�v�o tem mais ainda. Andando pelo com�rcio, algo me surpreende e intriga: S�o Crist�v�o, sabemos, � o padroeiro dos motoristas; pois bem, exatamente a�, nesse bairro, se concentra uma imensa quantidade de lojas de autope�as, a maior do Rio. Donde ter� surgido essa aproxima��o teol�gico-comercial? Pura coincid�ncia?
O sol pleno do meio-dia ilumina a pe�a de autom�vel cromada dependurada na porta da loja. Refletido nela, vejo o pr�dio do antigo Col�gio Pedro II: eis o Bairro de S�o Crist�v�o dos contrastes e converg�ncias!
Outra surpresa: o bairro de S�o Crist�v�o nos aproxima do infinito, das estrelas. Sim, l� no alto fica o Observat�rio Nacional, de onde se pode observar o maravilhoso e inigual�vel c�u do Brasil. Sem andar muito podemos, pois, passar da velha Rua Bela � pr�pria Via L�ctea!
� nossa por��o crian�a - que os mais inteligentes e sens�veis procuram preservar a qualquer pre�o - S�o Crist�v�o ainda reserva o Jardim Zool�gico. Andando por essas alamedas, comendo o mesmo algod�o-doce, real ou o imagin�rio, da nossa inf�ncia, entramos num mundo diferente de cheiros e sons: os ind�ceis le�es e leopardos, o majestoso elefante, a gentil e grandona girafa, os macacos cheios de sem-vergonhice, os lindos p�ssaros multicoloridos - tudo nos evoca, pelo olfato, pela audi��o, tempos idos, de excurs�es com a turma do col�gio, ou de passeios com aqueles parentes do interior, entre os quais a priminha bonita e graciosamente caipira merecia olhares e leves toques de m�o especiais.
S�o Crist�v�o: imperial e plebeu; comercial e puramente rom�ntico; hist�rico e vivo no presente. N�o h� outro bairro assim no Rio, t�o de extremos, t�o expressivo de nossa carioquice antiga, de hoje e de sempre.
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