Alma Carioca

Graja�

por Paulo Afonso A. Teixeira

Tive a felicidade de morar no Graja� at� os 14 anos de idade. O Graja� �, ou pelo menos era naquela �poca, um bairro com cara de cidade pequena, de ruas tranq�ilas e bem tra�adas, um lugar ideal para se viver.

Como escrever sobre o Graja� sem relembrar toda a minha inf�ncia, correndo o risco de transformar essa p�gina numa esp�cie de di�rio, podendo at� parecer rid�culo, infantil e saudosista ? Pe�o desculpas se assim parecer.

As duas avenidas principais, Julio Furtado e Engenheiro Richard, perpendiculares, se encontravam no centro do bairro, na Pra�a Edmundo Rego. Todas as demais ruas eram paralelas a estas, indo da Visconde de Santa Isabel � Borda do Mato, no sentido norte/sul e da Bar�o do Bom Retiro � Canavieiras no sentido leste/oeste.

Dezenas de tamarineiras davam sombra e frutas �s duas grandes avenidas e eram tantas as frutas que o ch�o ficava repleto destas sem que houvesse necessidade de qualquer disputa para consegui-las.

Quase no extremo norte havia a "Escola Municipal Duque de Caxias", onde todas as crian�as do bairro estudavam. Escolas particulares eram raras e n�o ofereciam o mesmo n�vel de instru��o que uma escola p�blica. Bons tempos aqueles.

Muitas hist�rias poderiam ser contadas por quem l� viveu na d�cada de 50. Poderia lembrar das missas do Padre Alberto Ferro na Igreja de N.S. do Perp�tuo Socorro, do leite em garrafa, entregue de porta em porta (minha m�e juntava as tampinhas de alum�nio para doar � Igreja, se bem me recordo), das filas de madrugada para comprar carne, da mania de colecionar �lbuns de figurinhas (e da disputa no bafo-bafo), dos bot�es de galalite e dos feitos artesanalmente da casca do coco, muito mais �geis que os de pl�stico, e dos jogos de bolas de gude (n�o sobrava canteiro sem as tr�s "b�licas").

Havia carrinhos de rolim�s, apareceram as primeiras bicicletas motorizadas, as monaretas e gulivetes, e as bicicletas, esses eternos brinquedos, eram um sucesso. Se n�o me engano duas marcas disputavam a prefer�ncia das crian�as: Monark e Guliver, uma delas com freio contra-pedal. As ruas do bairro, cortadas por apenas uma linha de �nibus, a "110 - Graja�-Laranjeiras", eram prop�cias para andar de bicicleta. Descer a ladeira da rua Mearim, partindo da Visconde de Santa Izabel e cruzando a Marechal Jofre em alta velocidade, era um brinquedo perigoso. N�o haveria tempo para frear, se necess�rio fosse, e a possibilidade ou n�o de cruzar a Marechal Jofre era percebida apenas pelo sil�ncio. Algum carro que se aproximasse deveria fazer algum ru�do. Sorte que autom�veis eram raros naquela �poca e somente os passarinhos faziam barulho.

E com tantas �rvores, passarinhos n�o faltavam. A "sinfonia dos pardais anunciando o anoitecer" era ensurdecedora. Na pra�a Malvino Reis, ponto final do �nibus 109, j� praticamente fora dos limites do bairro, havia uma enorme concentra��o de pardais.

O Graja� T�nis Clube passava filmes para as crian�as nos finais de semana, com direito a cadeiras de madeira, muito calor no sal�o improvisado, al�m de constantes defeitos na proje��o. As cortinas quase sempre eram abertas por algum engra�adinho e a claridade interrompia a sess�o. Mas tudo era uma festa. O cinema era a principal distra��o num mundo em que a televis�o ainda engatinhava e poucos lares possu�am um aparelho receptor.

As meninas costumavam brincar de roda e pular amarelinha. Algu�m se lembra? Pobre das crian�as de hoje, �geis nos jogos eletr�nicos e computadores, confinadas em apartamentos e condom�nios, sem ter tido o prazer de saber como � simples a vida. E como � boa a vida simples.

N�o sei como est� o Graja� atualmente. Aquela paz deve ter acabado, n�o s� pelo volume de tr�nsito nas tranq�ilas ruas de minha inf�ncia, mas tamb�m pela viol�ncia disseminada por toda a cidade.

Alheio a tudo isso, imut�vel e eterno, o Pico do Papagaio continua sendo o s�mbolo maior da regi�o, como um obelisco erguido para homenagear aquele cantinho do Rio escolhido para ser uma cidade dentro de outra, um para�so perdido.

O GRAJA�, VISTO E FOTOGRAFADO POR C�NTIA SEGADAS

image/cintia01.jpg (69791 bytes) Rua Canavieiras - Foto de Cintia Segadas image/cintia02.jpg (25592 bytes) Casa do Graja�   - Foto de Cintia Segadas image/cintia03.jpg (35433 bytes) Casa do Graja�   - Foto de Cintia Segadas image/cintia04.jpg (37207 bytes) Casa do Graja�  - Foto de Cintia Segadas  image/cintia05.jpg (39254 bytes) Col�gio da Companhia de Maria  - Foto de Cintia Segadas
image/cintia06.jpg (56023 bytes) Av. Engenheiro Richard  - Foto de Cintia Segadas image/cintia07.jpg (32798 bytes) Igreja de N.S.Perp�tuo Socorro - Foto de Cintia Segadas image/cintia08.jpg (57841 bytes) Av. J�lio Furtado  - Foto de Cintia Segadas image/cintia09.jpg (51702 bytes) Rua Mearim  - Foto de Cintia Segadas image/cintia10.jpg (24159 bytes) Pico do Papagaio ou Perdido do Andara� - Foto de Cintia Segadas
image/cintia11.jpg (41519 bytes) Pra�a Nobel  - Foto de Cintia Segadas   image/cintia12.jpg (47008 bytes) Um pr�dio todo especial - Foto de Cintia Segadas   image/cintia13.jpg (47364 bytes) Reserva do Graja�  - Foto de Cintia Segadas

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C�ntia Segadas estuda Administra��o na Universidade Gama Filho. Sua cidade � Friburgo mas mora atualmente na casa dos av�s, no Graja�. Trabalha com inform�tica, como Analista de Suporte, adora fotografar e andar de bicicleta pelas ruas do bairro.

Agradecemos � C�ntia pelas imagens que t�o bem retratam esse recanto ador�vel.


Apenas com o intuito de atualizar, passo-lhe algumas informa��es a respeito do ainda muito agrad�vel bairro do Graja�.

As principais avenidas continuam sendo as "perpendiculares" J�lio Furtado e Engenheiro Richard encontrando-se na Pra�a Edmundo Rego que aos domingos vira �rea de lazer, com v�rias barracas da feira de artesanato, e onde anualmente, sob a organiza��o da Igreja N.S. do Perp�tuo Socorro, realizam-se as tradicionais festas juninas ou julinas e a Feira de Solidariedade do Graja� (FESOG).

As ruas continuam as mesmas com pr�dios de apartamentos substituindo v�rias das belas casas existentes no bairro, mas que ainda tenho a satisfa��o de informar, continuam sendo a grande maioria. Com a queda do poder aquisitivo e a falta de seguran�a, a tend�ncia � que o cen�rio se altere com a substitui��o das casas e predom�nio dos pr�dios de apartamentos. As tamarineiras continuam existindo e frondosas.

Com o crescente surgimento das escolas particulares e a queda na qualidade do ensino p�blico a "Escola Municipal Duque de Caxias" deixa de ser absoluta.

Colecionar �lbum de figurinhas ainda � mania, pelo menos essa � a id�ia que meus filhos, sobrinhos e seus amigos me passam. Raro � disputar o bafo-bafo, talvez pelo formato atual, que dificultam a pr�tica. V�rias mesas para o jogo de bot�o s�o armadas aos domingos no centro da pra�a Edmundo Rego. Bola de gude virou raridade, acredito que seja pela limita��o de espa�os existentes para esse tipo de brincadeira. Brincar de roda e pular amarelinha idem. O skate substituiu os carrinhos de rolim�s, surgiram v�rios tipos novos de bicicletas, inclusive com pre�os mais acess�veis. O v�deo game est� conquistando cada vez mais adeptos.

As ruas do bairro continuam sendo cortadas por apenas uma linha de �nibus, a "422 - Graja�-Cosme Velho". A quantidade de carros aumentou consideravelmente assim como a viol�ncia, mas a tranq�ilidade, uma das caracter�sticas do Graja� ainda se mant�m.

Voc� n�o citou a Reserva Florestal do Graja�, localizada na Rua Comendador Martinelli. � um espa�o �timo para as crian�as, inclusive com um campo escola para os aprendizes de alpinismo. Infelizmente a Reserva est� passando por um per�odo de "quase" abandono.

            Um abra�o,  

                      Oswaldo Francisco de Luca (*)

(*) Oswaldo � casado, tem dois filhos e mora no Graja� h� 16 anos. Trabalha no IBGE, na �rea de Pesquisa Social.


Aos amigos Paulo Afonso e Oswaldo Francisco de Luca:

Ambos muito felizes quando retrataram o nosso "amor" chamado Graja�. Apenas gostaria de ilustrar que nasci na Rua Bar�o de Mesquita, no trecho entre Marechal Jofre e a Pracinha Malvino Reis, hoje Rua Jos� do Patroc�nio, numa casa de altos e baixos, que o progresso n�o perdoou, transformou-a em edif�cio. Logo ap�s ter nascido, minha fam�lia mudou-se para o 136 da Avenida J�lio Furtado, onde vivi at� os meus doze anos.

Vivi a minha inf�ncia um pouco antes do Paulo Afonso, no final dos anos 40, indo at� o princ�pio dos 50, e nesse per�odo ainda n�o tinha chegado a moda os carrinhos de rolim�s. Nossa divers�o maior era o futebol, que era praticado na Rua Itabaiana sobre as cal�adas. Pegar peixinhos coloridos no pequeno po�o, no final da Engenheiro Richard, j� no sop� do morro, tamb�m fazia parte do nosso dia-a-dia.

Creio ter curtido intensamente a minha inf�ncia naquele cantinho aben�oado por Deus. Tinha o privil�gio de acordar, ir at� a varanda do meu quarto e ver o Pico do Papagaio, respirando ar puro.

As duas linhas de �nibus eram: 109 (Graja�-Ipanema) e 110 (Graja�-Cosme Velho), ambas saindo da Pracinha Edmundo Rego.Peguei o tempo em que o lixo dom�stico era recolhido por carro�as puxadas por uma parelha de burros, e o leite era vendido pela "vaca leiteira", uma esp�cie de caminh�o pipa, que estacionava na conflu�ncia de Julio Furtado com Professor Valadares, indo os moradores, com suas garrafas, comprar o leite. O peixe, sempre fresquinho, era vendido pelo "Seu" Germano, e os legumes e verduras se comprava na feira das sextas, na Julio Furtado.

Sempre, depois do almo�o, passava uma senhora, a qual nunca soube o seu nome, com um chapel�o de palha, apregoando seu produto - pudim royal e folhas de gelatina.

Tive duas cole��es: Balas Ruth e chapinhas do Guar�.

Tipo exc�ntrico era o "Camar�o", que fazia ponto na pracinha Malvino Reis, sempre fumando o seu charuto. Ao ouvir seu apelido, gritado pelos estudantes que passavam no bonde, sempre colocava em pr�tica o repert�rio de palavr�es e gestos, indicando a famosa "banana".

O p�ozinho era comprado na Caprichosa, padaria que ainda existe, hoje com mais variedade de ofertas. Do seu lado a Matriz de Nossa Senhora do Perp�tuo Socorro,onde fiz primeira comunh�o e me crismei. Conheci o o padre Alberto. Embaixo do pr�dio, no lado oposto da padaria, t�nhamos: bem na esquina o armaz�m, a farm�cia, o barbeiro, onde eu cortava cabelo com o Chico, e a quitanda. O com�rcio local limitava-se a isso.

Nas noites de muito calor meu pai nos levava at� a cascatinha, uma pequena queda d'�gua no alto da Rua Borda do Mato. O "tabu" era uma casa enorme, localizada na Rua Visconde Santa Isabel, bem em frente a Av. Julio Furtado. Ali funcionava um hosp�cio. Nenhum de n�s se aventurava a chegar perto, pois diziam que "aquela doen�a pegava".

A Escola Duque de Caxias, onde fiz o prim�rio, vizinha do Corpo de Bombeiros, ainda existe, mas sem aquele charme com o qual convivi. De todas as professoras a que at� hoje reverencio � "Dona" Heda dos Santos Costa, u'a mestra que nunca utilizou amea�as de puni��es para qualquer aluno. Aprend�amos com vontade. Quer�amos sempre demonstrar que �ramos inteligentes; que os deveres de casa, para n�s, eram como se fossem um trof�u a ser conquistado na aula seguinte.

Para encerrar, presto uma homenagem a gera��o dos meus irm�os, Milton e Nelson (j� falecidos), que participavam da "Turma do Sereno", a qual era composta por outros tantos rapazes na faixa dos 20 anos de idade. Eles editavam um jornalzinho, rodado na base do mime�grafo, o "Orvalho" - que apontava de forma irreverente as mazelas , fatos relevantes acontecidos e cr�ticas a moradores que se indispunham contra eles. Lembro uma ocasi�o que deu um problema, o qual n�o me recordo muito bem, mas teve implica��es pol�ticas, pois viv�amos em plena ditadura Vargas, e o Orvalho tinha publicado um trecho de "Jeca Tatu", obra do imortal Monteiro Lobato, proibida ent�o pelo regime.

N�o me considero um saudosista. O que tenho guardado dentro de mim, � um sentimento de paix�o, ternura pela casa em que morei , pelo bairro em que nasci, e que at� hoje amo sem limites.

Quanto � minha casa, no quintal de terra, al�m do galinheiro, tinha a casinha do meu cachorro Duque e dispunha de tr�s mangueiras, uma goiabeira, um p� de abiu, um mamoeiro e a minha preferida - a jaboticabeira.

Lembrando Vinicius de Moraes, que teve a mesma alegria que eu, com a sua jaboticabeira, cito o fecho do seu poema "Olha Aqui Mister Buster " - "olha aqui Mister Buster , olhe bem aqui : Voc� n�o sabe o que � de ter uma jaboticabeira no quintal. Voc� n�o sabe o que � torcer pelo Botafogo!".

Dessa forma, homenageando o nosso poeta, revelei a minha paix�o tamb�m pelo Botafogo, mas acrescento que dentro do meu cora��o tamb�m continua o amor e orgulho pelo Graja� T�nis Clube, o primeiro campe�o carioca de futebol de sal�o, com muito orgulho!

Tenho a certeza de que a alegria do "Poeta Maior" seria maior se, como e, tivesse nascido e morado no nosso adorado Graja�.

Um forte abra�o, meus amigos.

Foi l� que tive a minha primeira namorada, Cec�lia, coleguinha de sala, por quem, com apenas 10 anos, me apaixonei. Imaginem !!!!!!

Tenho a certeza de que as nossas declara��es de amor pelo bairro ser�o eternas.

Tal como os sonhos, n�o morrem jamais.


Em tempo - agrade�o a chance de ter "matado as saudades" atrav�s das fotos de C�ntia Segadas, tiradas com muita sensibilidade.

Antonio Carlos Lopes
Jornalista e publicit�rio.


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