Mercado do Peixe de Niterói

Quando o Nazareno andava lá pela Galiléia, tentando cumprir a ingrata missão de arregimentar discípulos que pudessem dar prosseguimento à espinhosa tarefa de converter os animais humanos à Boa Nova celestial acabou encontrando entre os pescadores os homens simples, de fé, sinceridade e dedicação ao trabalho que andava procurando. Dentre eles, Pedro, a quem disse “Tu és a pedra sobre a qual edificarei minha Igreja”.

Desde então, aquele que viria a tornar-se São Pedro, tornou-se não somente o simbólico pilar de sustentação da igreja católica como também o padroeiro dos pescadores. Daí vem o nome do “Mercado de São Pedro”, situado na Ponta da Areia, onde os fiéis de um outro culto – o da gastronomia – encontram o que procuram para sua fé gustativa, os frutos do mar.

Chegando às proximidades do mercado, de longe o cheiro inconfundível de peixe fresco atinge nossas narinas, antecipando as iguarias que poderão ser preparadas. É aquele cheirinho de almoço de domingo na casa da mãe, em que a reunião em torno da mesa redime até irmãos rusguentos, cunhadas fofoqueiras e netos insuportáveis.

Bom mesmo é entrar no mercado e passear com calma, observando tudo. E que isso seja feito cedinho, quando a manhã ainda não se firmou como luz dourada e forte, quando os raios de sol parecem ainda hesitantes, trazendo com eles as toneladas de peixes que acabaram de ser tiradas do conforto do mar e trazidas para o meio dos humanos, onde serão convertidas no destino comida.

Os boxes, primeiro iluminados com luzes artificiais, vão aos poucos sendo banhados pela luz do dia e revelando seus tesouros: peixes grandes, médios, pequenos e pequenininhos, com um colorido que vai dos predominantes tons de prata à vermelhidão das guelras sanguinolentas. Dourados, pintados, robalos, namorados, xereletes, atuns, lagostas e lagostins, sardinhas, salmões, anchovas, camarões, polvos – uma infinidade em formas, tipos, espécies se mostra, representando a imensa riqueza da fauna marinha.

Comovo-me ao olhar os peixes assim, imobilizados na morte, com as nadadeiras para sempre impossibilitadas de impulsionar esses belos animais pelas águas verdes ou azuis. Naqueles olhos ainda brilhantes, parece-me haver imagens guardadas como uma memória da imensidão líquida onde nasceram e viveram sempre. Vejo sempre neles uma grande nostalgia do oceano. Porém reconheço que as cadeias alimentares têm de ser mantidas, mesmo em relação aos homens, que se intrometem nesse ciclo de vida marinha para transformar os seres do mar em seus alimentos.



Na medida em que a manhã avança, o mercado vai ficando mais movimentado e acaba fervilhando de gente, em meio à qual se instaura uma algazarra, com vendedores que gritam chamando a atenção de prováveis compradores.

Dentre os que compram, há uns tipos característicos, que se destacam em meio às donas de casa, aos fregueses comuns. É uma gente fina, bem vestida demais para o ambiente, e mesmo alguns falando idiomas estrangeiros. São os chefes de cozinha, ou seus representantes. Quase todos vêm do Rio, em busca dos peixes frescos e de qualidade, que serão transformados em iguarias caríssimas servidas nas mesas de restaurantes chiques.

O jogo da compra e venda é geralmente muito rápido, cabendo sempre uma pechinchada. Então, mãos hábeis põem-se a limpar os peixes; as facas muito afiadas reluzem, raspam escamas daqui, estripam barrigas dali; as balanças acusam os pesos e o dinheiro muda de mãos... E lá vão os frutos do mar nas sacolas, rumo às mesas onde satisfarão paladares mais simples ou mais refinados.



Bom também é subir as escadas e olhar o mercado do jirau. Debruçando-se ali, vemos os boxes e toda a sua movimentação, só que o alto, de outro ângulo.

Lá em cima existe um outro ambiente, o dos bares e pequenos restaurantes, onde se pode comer os peixes ali mesmo, ouvindo o alarido das compras em baixo e sentindo todo o cheirinho de peixe fresco.



Luxo não há; as toalhas, geralmente de tecido simples e com desenhos xadrez, escondem mal um certo encardido. Mas quem se importa? O peixe é fresco e de qualidade; as cervejas são estupidamente geladas; os garçons são simpáticos e a informalidade impera. Além disso, para quem acordou cedo, os roncos do estômago são ordens imperativas!

E São Pedro, o mencionado pilar da Igreja, onde estará? Lá está ele, num nicho que domina o mercado. A imagem simples e bela, com colorido forte e modelagem bem adequada à rusticidade da vida de pescadores, domina o ambiente, com o santo velando por todos os que vêm e vão no dia-a-dia do mercado. As bênçãos mais carinhosas certamente vão para os pescadores, esses homens que buscam no mar o seu sustento, trazendo para todos o benefício dos peixes, esse alimento especial, certamente gostoso, certamente divino.

Texto e fotos de J.Carino.

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