Araribóia

“Cobra das Tempestades” ou “Cobra Feroz”, eis o que nos diz o significado etimológico do nome Araribóia. No entanto, ao olhar sua estátua defronte às barcas, em Niterói, não contemplamos nenhuma imagem de ferocidade.

O que a estátua desse valoroso cacique transmite é a noção de nobreza. Firmemente plantado em seu patamar de pedra, o corpo do silvícola, embora em repouso, parece ligeiramente retesado; calmo, porém pronto para a ação. Contrariando-lhe a etimologia do nome, o que Araribóia nos exibe em sua representação não tem nada de feroz: é determinação,

A implacável pátina do tempo cobriu seu belo corpo em bronze com aquele tom esverdeado que, com freqüência, junta o ridículo à aparência de muitos personagens da história do Brasil, eternizados, injustamente, em nobre metal. Mas, com Araribóia é diferente. Uma dignidade vinda do fundo do tempo, devida à sua trajetória em vida, parece torná-lo imune às falsas homenagens.

Muito feliz foi o escultor ao atribuir aquele olhar altivo ao maravilhoso guerreiro. Mesmo de tanga, Araribóia revela-se muito mais elegante do que os enfatiotados em bronze figurados na maioria das estátuas que vemos por aí. Sua elegância parece brotar do interior da escultura, como uma chama perenizada, aparentemente contida pelo imobilismo, mas, na verdade, sempre pronta a nos aquecer a alma de brasileiros, lembrando-nos os muitos heróis verdadeiros que construíram a brasilidade.

Quando o pôr-do-sol acrescenta uma camada de ouro à estátua, outro espetáculo acontece. Pombos, vários, branquinhos e agilíssimos, se encarapitam nos ombros do nobre guerreiro. Então, gosto de imaginar os tempos ancestrais de nossa pátria, quando aves brancas esvoaçavam por sobre as canoas, vigorosamente impulsionadas por braços fortes de índios empenhados em transformar velozes peixes de prata no alimento assado nas fogueiras, no centro das malocas. Essa gastronomia de puro requinte elementar transformava o fogo - cálida fonte de aconchego e de congraçamento - no centro do relacionamento comunitário e numa ágora tupiniquim, espaço de fraternidade pessoal e de entendimentos políticos.

A bravura, hoje imortalizada em bronze, corria nas veias e convertia em aço os músculos desse filho de Maracajá-Guaçu, cacique da tribo dos Temiminós. Se era necessário pôr a coragem a serviço de invasores, como os portugueses, contra outros, os franceses, que assim fosse. Mas a Terra Brasilis haveria de ser defendida, a qualquer custo, e com ela a cultura-mãe de cada guerreiro, esculpida em liberdade para caçar, pescar, procriar; moldada nas visões de beleza de um paraíso na terra; forjada num ingênuo porém imprescindível desejo de vida feliz, em paz e numa harmonia que deveria reinar entre os homens vivendo num mundo fraterno.

Araribóia lutou e venceu. Foi festejado e, irônica mas sinceramente, recebeu um nome de branco: Martin Afonso de Souza.



Fico imaginando a dignidade com que Araribóia recebeu essa batismo de um Deus que os cristãos pretendiam monopolizar e, além disso, impor aos “bárbaros”. Deus que Araribóia via em cada braço de rio, com a água iluminada pelo sol da manhã; em cada montanha coberta pelo tapete de vegetação, verde de vida e generoso na abundância dos frutos continha e da caça que abrigava; no céu, absurdamente azul de dia e profundamente escuro em certas noites, nas quais os olhos se perdiam na imensidão desse veludo negro pontilhado pelos incontáveis diamantes das estrelas. Que via também no caleidoscópio de cores das penas das aves; no som melodioso do canto de todos os pássaros; na prata das escamas dos peixes rebrilhando ao sol. E que sentia no amor repartido fartamente entre pais, filhos, amigos, esposos e esposas. Ou reverenciava na sua idolatria sincera, vivida com intensidade em cerimônias de muita beleza ritual e muita fé genuína.

Araribóia recebeu recompensas materiais por sua ajuda. Entre elas, a grande sesmaria doada por seu amigo Mem de Sá, que ocupou a região de São Lourenço e de Caraí, esta a nossa Icaraí de hoje.

Com seu olhar sobranceiro e seu porte magnífico, Araribóia dignifica nossa terra, pelo que fez no passado e pelo que ainda representa no presente: a coragem, a altivez e o amor por toda a terra brasileira, mas especialmente, com maior intensidade, por nossa querida Niterói.

Texto e fotos de J.Carino.

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