Terra Molhada
J.Carino
Incompar�vel. Nada existe como o cheiro da terra molhada pelos pingos da chuva num dia de ver�o. Nesses momentos, o sentido olfativo � uma b�n��o. Animais humanos, somos nesses instantes absolutamente tel�ricos, gostosamente imersos no cheiro que nos penetra.
Se andando na chuva, � poss�vel sentir o toque sutil das p�rolas cristalinas que tocam nosso corpo; se abrigados, sobrev�m uma vontade irresist�vel de ver a chuva, que nos chama tamborilando na vidra�a.
� gostoso contemplar a terra c�lida, ainda nost�lgica do sol, receber em seu seio, e absorver, as gotas frias de �gua que tombam do c�u - canteiro molhado por um deus-jardineiro caprichoso.
Olhando com aten��o a terra, � poss�vel ver que, no contato com o solo, o l�quido, sofrendo milagrosa metamorfose, transforma-se em nuvenzinhas brancas muito sutis, que escapam em dire��o ao c�u, no eterno c�rculo onde nada se perde.
O ar, saturado do perfume inconfund�vel surgido da fus�o de �gua e terra, fica gostoso de sorver. E parece que tudo esperava esse presente l�quido-terroso: a superf�cie rugosa da madeira; as dobras elegantes dos tecidos; o
p�lo sedoso dos animais; a superf�cie negra do asfalto aquecido; a rigidez do concreto; o cabelo brilhante das mulheres; a maciez do capim...
H� um limite para esse momento de pura magia. A chuva deve ser r�pida, quase tanto quanto um beijo roubado. Durando demais, encharca tudo, entranha-se na terra, alaga, afoga - subjuga coisas e gente na umidade, parecendo tudo liquefazer: do barro antes orgulhoso de sua dureza � pr�pria alma dos seres humanos, que parece mergulhar em tristeza ao mesmo tempo em que sente um mundo mergulhado em chuva.
Cessado o bombardeio dos cristais transl�cidos - as gotas de chuva -, permanece, por um tempo nas narinas e mais tempo na mem�ria, esse cheiro de terra molhada, esse odor inconfund�vel, essa fragr�ncia �nica - perfume singular, aroma inigual�vel que parece, a cada vez, acumular-se em diminuta quantidade no frasco de nossa alma.
Passado o momento m�gico, tudo em volta se modifica: o ar fica mais l�mpido; a nitidez com que podemos ver o mundo se
acentua; as cores tornam-se v�vidas, agu�ando os contrastes entre tons antes apenas sutilmente divisados.
Pobres espectadores diante do milagre que se repete, nada h� que fazer. Resta-nos apenas viver, e sair talvez assoviando uma can��o...
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