Alma Carioca

Vento

J.Carino

Pode ser suave, e apenas roçar os pêlos do braço, como um carinho inesperado. Mas pode também ser violento, brutal, e arrancar casas de seus alicerces e árvores centenárias dos lugares onde esperavam ficar até fenecer.

O vento é assim: belo, poderoso, imprevisível, contraditório.

Sentir o vento é sentir a vida. Nosso alento é ar movido pelos deuses para dentro de nossos pulmões - um sopro delicado, âmago da criação. É comovente observar o sobe e desce cadenciado da respiração movendo o peito da mulher ou do homem amados, adormecidos e presas da languidez inevitável que sobrevém depois do ato de amor. Este é o vento manifestado em paixão.

Ouvir o vento assoviar nas frestas da janela em noites de chuva é como ouvir uma sinfonia magistral executada pela natureza. Eis o vento em solo vigoroso fazendo penetrar em nossos ouvidos a música composta para se escutar com a alma em longas e solitárias madrugadas.

Dá gosto ver o vento brincalhão, o vento-menino, que tira a folha outonal lá de cima do último galho da árvore e dança com ela uma linda valsa de movimentos suaves, sobre ondas invisíveis, e leva-a até ao chão, onde a deposita com o cuidado e a delicadeza de que só são capazes os querubins.

Coisa belíssima é ver o vento enfunar a vela de um barco que singra o mar numa dessas manhãs de inacreditável azul. O pano da vela finge resistir ao irresistível; o mastro parece fazer um esforço imenso para não vergar, enquanto o panejamento da vela se enche; desse duelo vem a força que move o barco com determinação e leveza sobre a superfície espelhada das águas translúcidas.

Dá medo ver a violência do vento convertido em furacão. Dir-se-ia que é um louco em fúria destruidora, e nada há que resista: tudo é arrastado, se parte, se arranca; o vento mostra-se, então, uma força terrível que age em nome de uma natureza vingadora.

Há um vento maroto e impudico que levanta a saia das mulheres, vento cúmplice dos olhares de desejo. O tecido leve nunca se ergue à primeira lufada; não, ele vai subindo um pouco de cada vez, driblando as mãos que inutilmente tentam (às vezes sem muita convicção e vontade) evitar o movimento que desnuda. Finalmente, sobrevém a vitória do vento sem-vergonha, e as partes ocultas pelo pudor se mostram, eternizando o jogo libidinoso que dura desde a expulsão do paraíso...

Que dizer do vento-poeta? Esse vaga, com olhos brilhantes de amor, pelos jardins. De repente, pára ao encontrar uma rosa rubra e de pétalas ainda úmidas do sereno da noite. Com elegância, tal vento apaixonado pelas musas vai despetalando delicadamente a flor, enquanto versos inaudíveis ecoam no peito de todos os amantes.

Existem ainda os ventos de tão longo alcance que envolvem a Terra em sua amplidão. O astro azul mantém-se agasalhado graças aos ventos, que fazem circundar pelo planeta as nuvens brancas, imensas e alvas, longuíssimos mantos a proteger a morada dos homens em sua vertiginosa viagem pelo espaço infinito.

Vento amigo ou vento ameaçador; de vida ou de morte; forte ou suave. Maravilha que assovia de encontro ao arvoredo; que lança as ondas contra os rochedos; que nos acaricia o rosto nas manhãs de outono, lembrando-nos como é gostoso poder sentir, como é maravilhoso poder viver.

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