Crônica Veloz
J. Carino
Desejo que esta crônica seja rápida, célere como um bólido de Fórmula Um
correndo nas quebradas de uma noite metafórica, onde há que desviar, com perícia, de vírgulas
mal postas, de pontos mal colocados.
Ou, melhor ainda, veloz como um corcel marrom-claro galopando, com altivez,
na manhã ensolarada, pela campina verdejante coalhada de adjetivos pomposos, substantivos
mais do que concretos e advérbios bem proverbiais.
Rápida como um pensar vertiginoso, que se comporte qual um menino ágil e
sadio na brincadeira de pique-esconde: um pensar que não se deixe agarrar pelas metáforas
pastosas nem pelas analogias pegajosas.
Uma crônica veloz que fale de sensações e sentimentos vividos com rapidez:
a lambida no sorvete; a ardência da pequena queimadura; o tropeção quase, quase tombo;
o adeusinho ao conhecido muito chato; a corrida de taxi com um motorista loucão; aquele
beijo roubado; aquela transa tão fugaz quanto inesquecível...
Rapidez: como no revirar de olhos da menina sedutora; como nos dedos
impressionantemente rápidos do prestidigitador; como nos pés com asas de um corredor; como no
choro brevíssimo e sem lágrimas da criança esperta, logo contentada pelo presente que queria.
Rapidíssima crônica, como as sinapses eletrônicas no interior dos
computadores; e como as ultra-rápidas mensagens por elas possibilitadas, substituindo a
lentidão das cartas, mas impedindo o muitas vezes necessário arrependimento que, simplesmente,
as convertia em papel picado.
Crônica célere como as máquinas que produzem muito, excessivamente até,
para um lucro que beneficia tão poucos.
Rapidez como a de um flash que consagra a nova beldade e condena ao
ostracismo e ao desespero a bela de ontem.
Seja rápida esta crônica, para não dar tempo de pensar na loucura da
rapidez que nos envolve, desenraíza e transporta para o não-sei-onde nas asas velozes
do não-sei-o-quê.
Crônica para ser lida rapidamente, sem sentir o amargor, a ironia, os
subterfúgios, os engodos contidos nas frases e palavras, que só podemos descobrir quando
as desnudamos com calma, com a impiedosa vagareza de quem pára, reflete e... compreende.
Rapidíssima crônica seja esta, como os astros velozes na imensidão
silenciosa do espaço infinito; como as aceleradíssimas partículas atômicas e sub-atômicas -
realidade veloz que contraria nossa enganosa visão de uma plácida permanência de todos os
seres, de todas as coisas.
Velocíssima crônica, como as batidas descompassadas de um coração
acelerado pela paixão e pelo desejo.
Crônica rápida, que acaba aqui, neste átimo de segundo,
que a-ce-le-ra-da-men-te já virou passado. Tudo assim, rápido, célere, apressado, na
eterna vertigem do tempo corrido, sentido, vivido.
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