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Depois de largo afastamento volto ao Rio
de Janeiro e a cidade segue sedutora como sempre, apesar das
amedrontadoras not�cias que sobre ela chegam na Bahia. Nesse quase final
de primavera embarco para uma semana dividida entre o trabalho de julgador
de primeira viagem do Pr�mio Esso de Jornalismo e o gozo do visitante
saudoso. "Minha alma canta", como na m�sica de Tom, quando sobrev�o a Baia
de Guanabara. No ch�o, entretanto, as primeiras impress�es deste novembro
no Rio me abatem.
E isso nada tem a ver com certas perip�cias pol�ticas -
e muitas malandragens - do pregador Anthony Garotinho, primeiro-cavalheiro
da corte fluminense, em seu esfor�o protestante para viabilizar-se como
candidato a sucess�o do presidente Lula. A insatisfa��o tamb�m n�o decorre
do desempenho administrativo do prefeito blogueiro do PFL, Cesar Maia.
Afinal, ele reduziu o seu tempo de navegante na Internet para olhar e
cuidar melhor da cidade.
A decep��o tem motivo afetivo. De amor - talvez seja
esta a express�o mais exata para o caso - a uma institui��o do Rio, t�o
apaixonante quanto o meu tricolor das Laranjeiras: o Jornal do Brasil, a
que estive vinculado durante quase duas d�cadas, desde o processo de
reforma tocado por Alberto Dines. Rememoro enquanto o t�xi que me leva do
Aeroporto para Ipanema roda pela pista da Avenida Brasil.
Na altura do bairro de S�o Crist�v�o, na suburbana zona
norte, bem � minha frente vejo o monumental edif�cio-sede do JB.
Constru��o erguida a peso de vultosos empr�stimos em d�lares, no tempo do
"milagre brasileiro" operado na ditadura militar pelo czar da economia de
ent�o, Delfim Neto, atual parlamentar do PMDB-SP e espadachim na defesa da
pol�tica econ�mica do ministro Palocci. O pr�dio abrigou o jornal durante
29 anos, tempo suficiente para praticamente servir de sepultura a uma mais
que centen�ria legenda da imprensa brasileira.
Obrigada a pagar as milion�rias d�vidas contra�das em
tempo de baixa irreal do d�lar, a empresa se descapitalizou. Veio ent�o a
asfixia financeira, sofregamente enfrentada com a venda das r�dios AM e
FM. A queda no precip�cio come�ou em 2002, no arrendamento por 60 anos do
que restava do grupo, com o jornal inclu�do no pacote, e o abandono do
pr�dio. O JB retornou, agora como inquilino, � antiga sede da Avenida Rio
Branco, onde purga o restante dos seus pecados.
In�meras vezes, andei na sede da Avenida Brasil 500 como
ovelha desgarrada de Salvador para participar de reuni�es de planejamento
de coberturas com alcance nacional: da Pol�tica, da Geral, da Economia, do
Esporte. Sou testemunha ocular do vigor e euforia - �s vezes, tens�o �
flor da pele - que percorriam todas as editorias do jornal como fagulha
el�trica.O entusiasmo come�ava na propriet�ria do JB, a Condessa Pereira
Carneiro.
Como esquecer das reuni�es de pauta, das id�ias e
debates da cobertura estimulados em diferentes fases por profissionais
como Carlos Castelo Branco (Castelinho), Jo�o Saldanha, Sandro Moreira,
Juarez Bahia, Z�zimo Barroso do Amaral e Felix de Athayde, entre tantos
que se foram. Ou por Paulo Henrique Amorim, Zuenir Ventura, Artur Xex�o,
Ricardo Noblat, Marcos S� Correia, H�lio G�spari, Walder de G�es, Carlos
Lemos, Hedyl Vale, Renato Machado, Xico Vargas, Beatriz Bonfim, Mirian
Leit�o, entre tantos que ainda a� est�o espalhados por outras reda��es, ou
no pr�prio JB como Evandro Teixeira e Rog�rio Reis, que revejo nesta
viagem. Sem falar da R�dio JB: Ana Maria Machado - hoje imortal da ABL- e
o incans�vel Proc�pio Mineiro � frente.
Na passagem, a vis�o do estrago, mesmo a distancia, d�i
fundo. O pr�dio do JB virou um edif�cio-fantasma de nove andares na
entrada da cidade. Abandonado, v�rias vezes saqueado e depredado, os
sem-teto levaram m�veis, divis�rias, portas e janelas.Os objetos de cobre
mais valiosos foram vendidos como sucata por R$ 8 o quilo e o alum�nio a
R$ 6. Atento, o motorista do t�xi percebe as l�grimas e se espanta. "O ar
do Rio continua com essa polui��o insuport�vel!", minto. O educado taxista
finge acreditar na desculpa, mesmo diante do l�mpido e ensolarado dia que
faz.
E chego a Ipanema em pleno meio dia, cercado da
luminosidade e das garotas de l�, que desfilam, patinam no cal�ad�o do
Pier e se bronzeiam na praia que o poeta Vin�cius de Morais, a Bossa Nova
e o desbunde dos anos 60 e 70 consagraram. Para frui��o e del�rio de
americanos, argentinos, italianos, portugueses e paulistas embasbacados
que agora disputam espa�os na areia com os nativos e aderentes e lotam
hot�is, bares e lojas.
Depois vem Copacabana e o Cine Roxy restaurado, onde
assisto ao belo e pungente document�rio "Vin�cius, 10 anos", de Miguel
Farias Jr. O cora��o fica leve outra vez e a alma volta a cantar.
Agrade�o, ent�o, ao poetinha e � Bossa Nova por esse reencontro de saudade
e esperan�a com o Rio de Janeiro.
Vitor Hugo Soares, jornalista, � editor de Opini�o
de �A Tarde�, de Salvador
[email protected]
Do blog do
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