Edi��o de 09-set-2007

 

NO BAILE DO MINISTRO DA BANDA LARGA
AUTOR N�O ENTRA

FERNANDO BRANT, compositor



O ministro Gil fala demais e ningu�m contesta. Chega. S�o quase 5 anos de a��es, gestos e palavras inconseq�entes, declara��es il�gicas e imprecisas, confus�o mental e irresponsabilidade. Vamos a alguns fatos.

Em 2004, o MINC quis aprovar a ANCINAV, projeto intervencionista que acabou arquivado. O que poucos souberam � que, em meio a centenas de artigos, existiam 4 que, contra a Constitui��o, usurpavam direitos dos autores musicais. O ministro compositor, n�o satisfeito, passou a defender a flexibiliza��o dos direitos autorais, al�m de maquinar desejos de estatiza��o dessa conquista universal dos criadores e artistas. E come�ou a elogiar um novo tipo de licen�a, o Creative Commons, inventada pelo professor americano Laurence Lessig, encampada por advogados ligados � Funda��o Get�lio Vargas e pelo MINC.

N�o creio que este engodo estivesse no programa de Governo de Lula. E nada disso foi discutido por Gil com a classe cultural. Mas, como se estivesse no palco e dele fosse senhor, resolveu fazer, dessa farsa, pol�tica de Estado.

E cita Thomas Jefferson, que dizia que uma id�ia n�o tem a for�a de propriedade de uma casa ou ferramenta. A obra art�stica � mais do que uma id�ia e esta �, no m�ximo, ponto de partida para a cria��o. A no��o que Jefferson tinha de id�ia era muito prec�ria. Ao mesmo tempo em que atacava a escravid�o em seus textos, mantinha duzentos escravos negros sob sua posse. � semelhante ao compositor-ministro: defende a liberaliza��o geral das obras pelos autores mas, apesar de ter sob controle toda as suas m�sicas, s� licenciou uma can��o, feita para um disco gravado na Noruega. As id�ias, neste caso, realmente pouco valem.

Cultura se faz com criadores, sejam indiv�duos ou uma coletividade. E o direito autoral � uma conquista da civiliza��o. Vem dos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade. O que se op�e ao iluminismo, que nos deu o direito autoral, � a barb�rie. E essa parece ser a meta dos que defendem o Creative Commons.

Eles sofismam e mentem quando dizem que os direitos autorais s�o caros. Quando, por exemplo, um cidad�o compra um CD por 35 ou 40 reais, a parte autoral, para todos os compositores, � de cerca de 1 real (ou 8,4% sobre o pre�o m�dio de f�brica, que anda pelos 15 reais). O autor n�o impede a obra de circular; ele � que a faz circular pois � ele que a cria.

O ministro canta loas � tecnologia, mas n�o quer que os autores utilizem os avan�os tecnol�gicos para preservar o que criaram. E o MINC incentiva empresas estatais a sugerir que os artistas renunciem a seus direitos.

Quem est� por tr�s desse massacre aos autores, dessa campanha mundial, economicamente forte e organizada? Certamente, os grupos que dominam a internet: a Microsoft, o Google, as telef�nicas, que poderiam usar obras art�sticas sem pagar. Por que o Gilberto Gil n�o prop�e uma �Technology Commons�, para que todos tenham acesso gratuito ao que os chamados provedores de conte�do nos oferecem mediante pagamento?

Qualquer que seja o assunto, o ministro descobre um jeito de atacar os autores. Ele tem id�ia fixa contra n�s. Piratearam um filme? � hora de mudar a lei autoral. Ele acha normal que se fa�am c�pias ilegais (� a modernidade, a tecnologia, a compuls�o da juventude). Ser� que ele julga correto que se viole contas banc�rias, se calunie pela internet ou se propague a pedofilia?

Se tantos praticam um crime, a solu��o seria mudar a lei para que tudo (matar, roubar) seja permitido? Gil repete como ladainha essa concep��o de mundo. Autor profissional n�o cai nessa, mas alguns autores jovens se convertem a essa religi�o suicida. Universit�rios e professores desavisados passam a defender tal anarquia. Quem defende a barb�rie n�o � moderno nem revolucion�rio. Quem est� a favor dos direitos n�o � conservador: � civilizado. Autores, artistas e m�sicos brasileiros: protejam-se do ministro b�rbaro, exterminador de criadores.

Lembrem-se da li��o de Cacilda Becker: n�o me pe�am de gra�a a �nica coisa que tenho para vender�.

 

Coment�rio de Ana Duarte:

First of all, como dizem os americanos... quero expressar a minha imensa admira��o pelo artista Gilberto Gil. Pela sua arte e pela sua obra. Pelo ser humano sens�vel e especial. E tamb�m, o respeito ao cargo que ele ocupa. Em nosso assunto de hoje, nada disso est� em pauta.

Tenho lido sobre este 'namoro' do Ministro com o tal 'Creative Commons', e primeiro, estranhei muito... afinal, ele � um compositor. Segundo, pensei: nossa quanta generosidade... Sim, porque deduzi que ele estaria dando o exemplo e abrindo m�o de seus direitos autorais; pois sendo compositor de tantas obras importantes, tem muito a oferecer � "modernidade e a compuls�o da juventude". Depois, percebi que ele aderiu � id�ia, incentivando outros a aderirem tamb�m... mas ele n�o a colocou em pr�tica!!

Eu, pelo menos, nunca vi publicada uma lista das m�sicas que ele abriu m�o de seus direitos... Voces viram?!?! Porque, vamos combinar... compor agora algumas m�sicas para doar seus direitos, n�o vale, n�. Quero ver ele doando os direitos de Expresso 2222, Super-homem, Domingo no Parque, Meu amigo meu her�i, Divino Maravilhoso, Refazenda, Preciso aprender a s� ser, etc... apenas para citar algumas obras dos seus mais de 40 anos de carreira.

Tenho uma pergunta ao Ministro e aos que querem eliminar o direito autoral: qual seria a id�ia deles para que os autores sejam remunerados? Sim, porque � importante lembrarmos que al�m do lado bonito e po�tico da cria��o, para os criadores isto � o seu TRABALHO. A sua forma de ganhar a vida. Pois �, acho que eles esqueceram que os artistas tamb�m pagam o supermercado, a presta��o da casa ou aluguel, escola das crian�as, gasolina, luz, telefone, roupas, celular, etc., etc. Que eu saiba, nenhum dono de supermercado, padaria, ou dono de im�vel, de escola, ou, o m�dico, o dentista, a Light, a CEG, a Tim, a Telefonica, etc., entregam seus produtos ou servi�os aos artistas sem receber pagamento em troca. � impressionante, n�... mas, ningu�m nesta nossa sociedade de consumo, doa aos artistas o fruto de seus trabalhos.

Por que ent�o teriam os autores que doarem as suas obras?? Ao falar de "modernidade, tecnologia e compuls�o da juventude" para justificar a libera��o do "copyrights", o Ministro e outros adeptos dessa teoria, est�o se esquecendo das leis b�sicas de mercado que regem a nossa vida (quer gostemos ou n�o disso). Se esquecendo que esta juventude � bancada por seus pais, e que a tecnologia que usam � vendida - e a pre�os bem salgados! Amigos artistas, sabiam que um cobi�ado Ipod onde eles querem baixar livremente as SUAS m�sicas pode custar quase mil reais no Brasil?!

Mas, em meu entender, o ponto mais importante disto tudo � outro. Por isso queria falar de dignidade. De amor. De como um artista pode sentir que � amado, que � aceito por seu p�blico. Tendo sido casada por 30 anos com um dos mais importantes e aut�nticos artistas deste pa�s, me sinto a vontade para falar de suas peculiaridades, do que chamo de "alma de artista". Um artista n�o cria para vender sua obra. Um artista cria por necessidade vital, porque a arte transborda de seu ser. Um artista cria por ser carente de aten��o, de aceita��o. Por ser carente de amor. Porque � amor que ele transforma em arte. E � amor que ele quer receber de volta. Quando uma pessoa vai a um show, est� dizendo aquele artista: eu gosto de voc�. Quando uma pessoa compra um disco, est� dizendo aquele artista: eu amo voc�.

O dinheiro usado na compra do ingresso, ou na compra do CD do artista, � o meio encontrado na sociedade que constru�mos nestes mil�nios, para fazer funcionar esta engrenagem. Para o artista n�o � meramente um fim, mas apenas uma conseq��ncia de sua cria��o. A forma do p�blico lhe dizer: eu te amo! E tamb�m a �nica forma dele ter dignidade em sua vida, e com seu trabalho poder oferecer sustento a sua fam�lia.


Ana Duarte - [email protected]

Produtora e publicit�ria, esposa do cantor e compositor Pery Ribeiro.



O que disse Gilberto Gil:




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21-fev-2008