LESLIE CARON

Luis Fernando Verissimo

"Fontaine de Mars" � um bistr� cl�ssico da Rue Saint Dominique, no s�timo arrondisement de Paris. Dois andares, n�o muito grande, uma cozinha honesta e um ambiente simp�tico. J� o conhec�amos de outras vezes e almo�amos l� no domingo. Na entrada a L�cia fez sinal na dire��o de uma das mesas e perguntou: "Viu quem est� ali?" Era a Leslie Caron. Quem n�o sabe quem � a Leslie Caron pare de ler imediatamente. Sentamos perto dela mas s� posso dizer que a Leslie Caron falou muito, em ingl�s, com quem a acompanhava. N�o ouvi o que disse. Apesar do meu natural desembara�o, n�o interrompi a conversa para perguntar o que, na sua opini�o, o Gene Kelly pensaria da atual situa��o do mundo em geral e dos americanos em Paris em particular.

No fim de "Um americano em Paris" fica subentendido que Leslie e Gene se casariam e, a n�o ser que, por press�o familiar, ele a levasse para morar no Kansas, ficariam em Paris e viveriam em technicolor, com trilha sonora do Gershwin, para sempre. N�o falei com ela porque temi que ela contasse que Gene abandonara a pintura, dera para beber e morrera ao cair no Sena depois de tentar um �ltimo sapateado na amurada da Pont Neuf. E tamb�m porque ela, Gene Kelly, Gershwin e os anos em que os americanos vinham a Paris para serem artistas e fugirem do que Henry Miller chamava de "o pesadelo ar-condicionado" da Am�rica, se j� eram remotos, ficaram ainda mais remotos recentemente. S� havia lugar no "Fontaine de Mars" num domingo de outono porque os americanos n�o est�o vindo a Paris. Temi que Leslie Caron respondesse �s minhas perguntas dizendo que nunca ouvira falar no World Trade Center e que americanos morrendo em pr�dios bombardeados na sua pr�pria terra simplesmente n�o eram do seu tempo, ou do tempo do Gene, e muito menos do Gershwin.

Mas tamb�m li que a ind�stria do entretenimento americano decretou uma suspens�o tempor�ria de filmes violentos e com efeitos especiais que possam lembrar as trag�dias, e quem sabe se os musicais, e mo�as francesas com caras inocentes como a Leslie Caron, n�o estar�o de volta? Tarde demais para a pr�pria Leslie Caron, que caminhava com dificuldade ao deixar o restaurante. Mas a sensa��o do momento do cinema franc�s � Audrey Tautou, uma jovem cujos grandes olhos ing�nuos s�o o ant�doto perfeito para o terror destes dias. Guarde este nome, Audrey Tautou, e tente esquecer o resto.