|
Amanhece, em Copacabana, e
estamos todos cansados. Todos, no mesmo banco de praia. Todos , que somos eu,
meus olhos, meus bra�os e minhas pernas, meu pensamento e minha vontade. O
cora��o, se n�o est� vazio, sobra lugar que n�o acaba mais. Ah, que coisa
insuport�vel, a lucidez das pessoas fatigadas! Mil vezes a obscuridade dos
que amam, dos que cegam de ci�mes, dos que sentem falta e saudade. N�s somos
um imenso v�cuo, que o pensamento ocupa friamente. E, isso, no amanhecer de
Copacabana.
As pessoas e as coisas
come�aram a movimentar-se. A mo�a feia, com o seu caniche de olhos ternos. O
homem de roup�o, que desce � praia e faz gin�stica sueca. O b�bado, que vem
caminhando com um esparadrapo na boca e a lapela suja de sangue. Autom�veis,
com oficiais do Ex�rcito Nacional, a caminho da batalha. �nibus colegiais e,
l� dentro, os nossos filhos, com cara de sono.
O banhista
gordo, de pernas brancas, vai ao mar cedinho, porque as pessoas da manh� s�o
poucas e enfrentam, sem receios, o seu aspecto. Um autom�vel deixou uma
mulher � porta do pr�dio de apartamentos � pelo estado em que se encontra a
maquillage, andou fazendo o que n�o devia. Os ru�dos crescem e se misturam.
Bondes, lota��es, lambretas e, do mar, que se vinha escutando algum rumor,
n�o se tem o que ouvir.
Enerva-me o tom de ironia que n�o consigo evitar nestas anota��es. Em vezes
outras, quando aqui estive, no lugar destas censuras, achei sempre que tudo
estava lindo e n�o descobri os receios do homem gordo, que vem � praia de
manh� cedinho. E Copacabana � a mesma. N�s � que estamos burr�ssimos aqui,
neste banco de praia. N�s � que estamos velh�ssimos, � beira-mar. N�s � que
estamos sem resson�ncia para a beleza e perdemos o poder de descobrir o lado
interessante de cada banalidade. Um homem assim n�o tem direito ao amanhecer
de sua cidade. Deve levantar-se do banco de praia e ir-se embora, para n�o
entediar os outros, com a descabida m�-vontade dos seus ares.
1959
|