Rio, JB e Vin�cius

Vitor Hugo Soares

Depois de largo afastamento volto ao Rio de Janeiro e a cidade segue sedutora como sempre, apesar das amedrontadoras not�cias que sobre ela chegam na Bahia. Nesse quase final de primavera embarco para uma semana dividida entre o trabalho de julgador de primeira viagem do Pr�mio Esso de Jornalismo e o gozo do visitante saudoso. "Minha alma canta", como na m�sica de Tom, quando sobrev�o a Baia de Guanabara. No ch�o, entretanto, as primeiras impress�es deste novembro no Rio me abatem.

E isso nada tem a ver com certas perip�cias pol�ticas - e muitas malandragens - do pregador Anthony Garotinho, primeiro-cavalheiro da corte fluminense, em seu esfor�o protestante para viabilizar-se como candidato a sucess�o do presidente Lula. A insatisfa��o tamb�m n�o decorre do desempenho administrativo do prefeito blogueiro do PFL, Cesar Maia. Afinal, ele reduziu o seu tempo de navegante na Internet para olhar e cuidar melhor da cidade.

A decep��o tem motivo afetivo. De amor - talvez seja esta a express�o mais exata para o caso - a uma institui��o do Rio, t�o apaixonante quanto o meu tricolor das Laranjeiras: o Jornal do Brasil, a que estive vinculado durante quase duas d�cadas, desde o processo de reforma tocado por Alberto Dines. Rememoro enquanto o t�xi que me leva do Aeroporto para Ipanema roda pela pista da Avenida Brasil.

Na altura do bairro de S�o Crist�v�o, na suburbana zona norte, bem � minha frente vejo o monumental edif�cio-sede do JB. Constru��o erguida a peso de vultosos empr�stimos em d�lares, no tempo do "milagre brasileiro" operado na ditadura militar pelo czar da economia de ent�o, Delfim Neto, atual parlamentar do PMDB-SP e espadachim na defesa da pol�tica econ�mica do ministro Palocci. O pr�dio abrigou o jornal durante 29 anos, tempo suficiente para praticamente servir de sepultura a uma mais que centen�ria legenda da imprensa brasileira.

Obrigada a pagar as milion�rias d�vidas contra�das em tempo de baixa irreal do d�lar, a empresa se descapitalizou. Veio ent�o a asfixia financeira, sofregamente enfrentada com a venda das r�dios AM e FM. A queda no precip�cio come�ou em 2002, no arrendamento por 60 anos do que restava do grupo, com o jornal inclu�do no pacote, e o abandono do pr�dio. O JB retornou, agora como inquilino, � antiga sede da Avenida Rio Branco, onde purga o restante dos seus pecados.

In�meras vezes, andei na sede da Avenida Brasil 500 como ovelha desgarrada de Salvador para participar de reuni�es de planejamento de coberturas com alcance nacional: da Pol�tica, da Geral, da Economia, do Esporte. Sou testemunha ocular do vigor e euforia - �s vezes, tens�o � flor da pele - que percorriam todas as editorias do jornal como fagulha el�trica.O entusiasmo come�ava na propriet�ria do JB, a Condessa Pereira Carneiro.

Como esquecer das reuni�es de pauta, das id�ias e debates da cobertura estimulados em diferentes fases por profissionais como Carlos Castelo Branco (Castelinho), Jo�o Saldanha, Sandro Moreira, Juarez Bahia, Z�zimo Barroso do Amaral e Felix de Athayde, entre tantos que se foram. Ou por Paulo Henrique Amorim, Zuenir Ventura, Artur Xex�o, Ricardo Noblat, Marcos S� Correia, H�lio G�spari, Walder de G�es, Carlos Lemos, Hedyl Vale, Renato Machado, Xico Vargas, Beatriz Bonfim, Mirian Leit�o, entre tantos que ainda a� est�o espalhados por outras reda��es, ou no pr�prio JB como Evandro Teixeira e Rog�rio Reis, que revejo nesta viagem. Sem falar da R�dio JB: Ana Maria Machado - hoje imortal da ABL- e o incans�vel Proc�pio Mineiro � frente.

Na passagem, a vis�o do estrago, mesmo a distancia, d�i fundo. O pr�dio do JB virou um edif�cio-fantasma de nove andares na entrada da cidade. Abandonado, v�rias vezes saqueado e depredado, os sem-teto levaram m�veis, divis�rias, portas e janelas.Os objetos de cobre mais valiosos foram vendidos como sucata por R$ 8 o quilo e o alum�nio a R$ 6. Atento, o motorista do t�xi percebe as l�grimas e se espanta. "O ar do Rio continua com essa polui��o insuport�vel!", minto. O educado taxista finge acreditar na desculpa, mesmo diante do l�mpido e ensolarado dia que faz.

E chego a Ipanema em pleno meio dia, cercado da luminosidade e das garotas de l�, que desfilam, patinam no cal�ad�o do Pier e se bronzeiam na praia que o poeta Vin�cius de Morais, a Bossa Nova e o desbunde dos anos 60 e 70 consagraram. Para frui��o e del�rio de americanos, argentinos, italianos, portugueses e paulistas embasbacados que agora disputam espa�os na areia com os nativos e aderentes e lotam hot�is, bares e lojas.

Depois vem Copacabana e o Cine Roxy restaurado, onde assisto ao belo e pungente document�rio "Vin�cius, 10 anos", de Miguel Farias Jr. O cora��o fica leve outra vez e a alma volta a cantar. Agrade�o, ent�o, ao poetinha e � Bossa Nova por esse reencontro de saudade e esperan�a com o Rio de Janeiro.

Vitor Hugo Soares, jornalista, � editor de Opini�o de �A Tarde�, de Salvador
[email protected]

Do blog do NOBLAT


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06-jun-2008