N�o esque�o nunca o dia em que ouvi, pela primeira vez, o magistral �Vai
Passar� de Chico Buarque. O ano: 1984. O Brasil nas m�os do �ltimo
general-presidente, Jo�o Batista de Figueiredo. A emo��o que a m�sica despertou
em mim foi imensa. Chorei muito. E sonhei muito. Tinha 46 anos, e at� ent�o
nunca votara para presidente da Rep�blica. N�o que n�o tivesse idade para isso
na elei��o em que venceu J�nio Quadros, mas estava fora do Brasil e naquele
tempo n�o vot�vamos quando no exterior.
Acreditava piamente que �dormia nossa p�tria m�e t�o distra�da, sem perceber
que era subtra�da em tenebrosas transa��es�, os versos iniciais dessa linda
m�sica, s� eram verdade porque n�o �ramos n�s que escolh�amos nossos
presidentes. Que as tenebrosas transa��es, mal deposit�ssemos nossos votos na
urna, desapareceriam.
Vem o Collor e foi aquele horror. Vem o Fernando Henrique, excelente Ministro
e depois Presidente da Rep�blica e, em seu primeiro mandato, renova minha f�. J�
no segundo, come�a tudo a desandar. Nas elei��es seguintes, ou�o pessoas a quem
respeitava, e outras a quem respeito muito ainda hoje, a declarar o voto
abertamente: Lula. Revi minha posi��o e percebi que o que me colocava contra o
Lula era um preconceito. Julgava que sendo algu�m sem instru��o formal, ele n�o
saberia governar o Brasil. Mas me convenci que isso, no fundo, era uma b�n��o,
pois ele, mais do que qualquer outro, iria compreender e encaminhar o Brasil de
modo a afastar de vez as injusti�as e a fazer de nosso povo um povo finalmente
feliz, educado, saud�vel, bem cuidado.
Entretanto, eu n�o contava com um dos versos mais terr�veis de �Vai Passar�:
�palmas pra ala dos bar�es famintos�. E eles chegaram, os bar�es, famintos,
sedentos, alucinadamente ansiosos para recuperar o tempo perdido. O tempo deles,
e n�o o tempo do Brasil. A fome e a sede dos senhores bar�es, e n�o a fome e a
sede dos brasileiros. E come�ou a mais tremenda das desilus�es.
Estamos vendo, nestes dias, fatos quase que inacredit�veis: as filas de m�es
com crian�as sofrendo, horas a fio, nos hospitais cariocas. O enterro de
crian�as v�timas de um mosquito que j� havia sido erradicado no Rio. A dor, o
sofrimento de uma cidade. E seu prefeito no computador, ironizando tudo e todos.
E o governador do estado em palanques, em festas in�teis e ofensivas, pois que
n�o respeitam a dor da cidade. E o ministro da sa�de? Esse para mim � o homem do
vou fazer, vou inaugurar, vou construir, vou atender. Est� sempre indo, nunca
foi.
Do presidente, nem falo. Esse vive em outra gal�xia: no mundo dos palanques.
Recorro outra vez aos versos de Chico Buarque: �O estandarte do sanat�rio geral
vai passar�.�
Est� passando, Chico. E repara que os homens que o carregam s�o, em sua
maioria, aqueles filhos que �erravam cegos pelo continente, levando pedras feito
penitentes�. Quem poderia imaginar que ao assumir o controle do Brasil, esses
penitentes fossem aceitar de vez sua condi��o de membros do sanat�rio geral? N�o
dava nem para imaginar tal coisa. Mas foi o que aconteceu.
Duas fotos, em minha opini�o, retratam muito bem o Brasil do Sanat�rio Geral:
uma publicada na capa da Folha de S�o Paulo, de 1� de abril, ter�a-feira
passada, durante a re-inaugura��o do p�lo petroqu�mico aqui no Rio. O presidente
Lula, rindo muito, todo feliz, aninha sua cabe�a no ombro do governador do Rio
de Janeiro, que tamb�m ri, carinhoso e satisfeito. Bela foto, feita num dos dias
em que estavam morrendo e sofrendo crian�as nesta que j� foi a doce cidade do
Rio de Janeiro.
A segunda foto foi publicada ontem, tamb�m na capa, s� que de O Globo. Essa
assusta. Traz o ministro Lupi �s gargalhadas. Primeiro pensei que fosse o
Ping�im, aquele arquiinimigo do Batman. Mas n�o, � o arquiamigo de Lula, o tzar
tupiniquim. O homem est� numa alegria de dar gosto: a farra foi sacramentada.
Agora, � s� recolher e gastar...
O sanat�rio geral est� a pleno vapor. Um "dossier" montado no seio do Governo
Federal circulou pelo Congresso. Pretendia servir como arma de defesa caso a
oposi��o adquirisse for�a para mostrar � p�tria ainda t�o distra�da, que as
tenebrosas transa��es continuam. Um Senador da Rep�blica resolve fazer o que
faria qualquer pessoa de bem: d� publicidade ao que estava sendo tramado nas
sombras. O sanat�rio se agita: como? Quem entregou o ouro ao bandido? Ah! dizem
aquelas cabe�as mais pensantes do Planalto, s� pode ser um tucano
infiltrado!�
N�o � uma maravilha? Com todos os sigilos, senhas, federais, abins, generais,
seguran�as, um tucano se infiltra no Gabinete da Dona Dilma e copia aquela
papelada que encheu 102 caixas e seleciona o que quer ver publicado. Como disse
uma leitora e comentarista aqui do Blog, a CuidadosaSeis, deve ser o Tucano de
Tr�ia. Algu�m o deu de presente aos habitantes do quarto andar do Pal�cio e os
tontos aceitaram o presente. Volto a pensar como pensava antes de 2002: a
instru��o faz falta. Se tivessem lido Homero, n�o cairiam nessa esparrela.
Mas que ningu�m se iluda. A for�a do sanat�rio � imensa. Tudo vai continuar
como dantes neste quartel d�Abrantes. Infelizmente.
Publicado em 4 abr 2008 - Transcrito do
Blog do Noblat com autoriza��o da autora e do Noblat.
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