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Heloisa Seixas
Se eu pudesse levar comigo uma paisagem, se pudesse congel�-la e guard�-la, se
pudesse t�-la eternamente, e rev�-la sempre que quisesse, quando fosse para uma
ilha deserta ou para outro mundo, n�o levaria uma � mas duas. Copacabana de
manh� e Ipanema � tarde.
Copacabana de manh�.
N�o a qualquer hora da manh�, mas �s oito em ponto. N�o em qualquer lugar, e sim na
Avenida Atl�ntica, no Posto Seis. Mas pode ser em qualquer �poca do ano, n�o
importa.
As amendoeiras
junto � areia, os barcos de pesca, as redes. No mar, de poucas ondas, uns
barquinhos, balan�ando. Al�m da ponta do Marimb�s, as flores de espuma que se
abrem em alto mar, quando a �gua rodeia as pedras submersas. Mais al�m,
horizonte afora, as cadeias de montanhas, intermin�veis, imut�veis, com suas
cores em degrad�, contendo todos os verdes, todos os cinzas, todos os azuis.
Na
areia, onde o sol acaba de chegar, a alvura dos gr�os em combina��o perfeita
com a cal�ada de pedras portuguesas, retrato em preto e branco cujas ondas
passeiam pelo mundo inteiro. E � esquerda, a curva majestosa bordejada de
pr�dios � n�o faz mal � terminando na pedra do Leme, com o volume do P�o de
A��car por tr�s. Uma curva feminina, sensual, pregui�osa. Copacabana � uma
mulher madura.
Ipanema, n�o. Ipanema � uma menina. � a outra
paisagem que eu levaria comigo.
Ipanema � tarde.
�s quatro da tarde, antes do p�r do sol. E sendo
outono. Ou um inverno com jeito de outono, como agora. Com muita, muita luz.
Mas n�o num dia qualquer, e sim num daqueles em que o vento sudoeste est� come�ando
a entrar, fazendo erguerem-se as cristas das ondas, como borrifos de monstros
marinhos. Banhando a paisagem, a luz da tarde, um pouco obl�qua, s� que muito
alva, de arder a vista. Luz que faz refletir a areia, � essa hora uma enorme
massa fria, pontilhada de banhistas tardios. Solit�rios. Porque �s quatro da
tarde de um dia assim, quem est� por ali, na areia ou no mar, caminhando ou
contemplando, � necessariamente um ser sozinho.
Na cal�ada, n�o. Na cal�ada � essa hora a vida fervilha. H� em quase tudo cor �
nos coqueiros, nos quiosques, nas latas de lixo � e as pessoas caminham em
frenesi, parecendo ter apenas um destino, um ponto de refer�ncia: as montanhas
ao fundo.
Outro dia, num �nico dia, pude admirar essas duas paisagens. Copacabana de manh�,
Ipanema � tarde. Num dia s�, apenas um, l� estavam � as duas. Paisagens para se
guardar na retina e na mem�ria, para se rever em pensamento sempre, nos
momentos de contempla��o interior.
� quase imposs�vel ser triste numa cidade
assim.
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